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  • Writer's picturePaulo Silva

Infraestrutura para o uso da bicicleta: além das faixas e estruturas de apoio

Updated: Jan 15, 2022

A bicicleta há muito tempo é utilizada como meio de transporte, surgiu primeiro do que o automóvel, há mais de 200 anos a sua primeira versão foi construída pelo barão Karl von Drais em 1817. De lá para cá muitas mudanças, cidades começaram a crescer, a população, que antes era predominantemente rural, passa a ser predominantemente urbana e os veículos motorizados começam a ocupar mais espaços nos grandes centros urbanos.


O anseio pelo moderno estava na figura do automóvel, seria ele o representante de uma sociedade inovadora e futurista. Novas ruas e estradas surgiam para abrir caminhos antes nunca percorridos, para que esta máquina revolucionária levasse o progresso por onde passasse.


Anos depois, a máquina revolucionária trouxe diversos problemas, hoje o automóvel polui mais do que a indústria, sua poluição é um grande fator para doenças respiratórias crônicas, o seu uso excessivo produz gases do efeito estufa, que alteram não apenas o clima local, como contribuem para mudanças regionais. As externalidades negativas do seu uso se sobrepõem em relação as externalidades positivas.


O automóvel deixou grandes cicatrizes na mobilidade urbana, principalmente no uso dos modos ativos. O pedestre perdeu espaço nas calçadas e os usuários de bicicletas não encontravam segurança para se deslocar em meio a motoristas que não tinham noção de dirigir com cuidado e/ou não queriam compartilhar a via com um veículo tão “lento”.


Hoje, utilizar a bicicleta vem, novamente, se tornando algo comum, como era cerca de 70 a 80 anos atrás. Mas, quem a utilizava há 30 anos era considerado “louco” por andar em meio aos carros. Não é preciso ir muito longe no tempo para entender o porquê de pessoas chamarem os ciclistas de loucos. No ano de 2010, a velocidade máxima na avenida mais famosa da cidade de São Paulo era de 70 km/h. Difícil de acreditar, se não fosse o histórico de imagens do Google Street View, acharia um absurdo uma via urbana com um limite de velocidade tão alta.



Imagem do Google Street View da Avenida Paulista, em São Paulo, no ano de 2010, destaque para a velocidade regulamentada naquele ano.


A situação começou a mudar a partir de 2014, no município de São Paulo, quando sua malha cicloviária começou a ser expandida e políticas de reduções de velocidade começaram a surgir, tornando o ambiente urbano um pouco mais favorável ao uso da bicicleta e mais seguro, do ponto de vista da segurança viária.


Atualmente, podemos dizer que a implantação de estruturas como ciclovias e ciclofaixas induziram uma demanda para o uso da bicicleta como meio de transporte, no caso do município de São Paulo. Mas, isso não é exclusividade da capital paulista, se outros municípios começarem a fazer o mesmo, é muito provável que mais pessoas comecem a usar a bicicleta como seu transporte principal.


Claro que é necessário cuidados na hora de implantar essas estruturas, pensar na topografia, qual a tipologia mais adequada, projetar pensando em ligações futuras, abranger os principais pontos de interesse existentes no município e levar em questão a segurança pública. Este último, infelizmente, muitas vezes não é considerado ou é pensado do ponto de vista do usuário masculino.


O caso de Marina Harkot, atropelada e morta por um motorista embriagado em novembro de 2020, é emblemático por alguns pontos. O primeiro mostra a impunidade da aplicação da lei, quem mata uma pessoa a atropelando tem grandes chances de não ser preso, principalmente se deixa o local sem prestar socorro (para não responder por um crime em flagrante). O segundo ponto é a questão do espaço público e a segurança, Marina pedalava em uma via que possui ciclovia, contudo, por conta do horário, utilizar a ciclovia a deixaria muito vulnerável a ser assaltada. Ela já relatava isso aos amigos, não só naquele local como em diversos outros, a dissertação do seu mestrado trazia essa temática do uso do espaço público pela mulher, de como os espaços se tornam limitados para mulheres, dependendo do local, do horário, do público, etc.


Indo para outra questão de infraestrutura, os ciclistas encontram uma imensa dificuldade de locais para estacionar sua bicicleta com segurança. Em um mundo ideal, os edifícios públicos e privados deveriam dispor de bicicletários, raramente isso acontece e até mesmo o ente público no momento de formular uma política pública de incentivo, acaba fazendo o oposto.

A imagem abaixo, retirada do perfil do Instagram do grupo Bike Zona Sul, um grupo de cicloativista do município de São Paulo, mostra um certo descaso do Governo do Estado de São Paulo ao tentar integrar o transporte público, no caso o Metrô, com o transporte ativo.



Foto tirada na Estação do Metrô Campo Limpo – Linha 5, mostrando paraciclos em local aberto e sem controle de acesso. Fonte: Bike Zona Sul, 2022.


Pode parecer uma boa vontade a implantação dos paraciclos na estação, no entanto, esse tipo de infraestrutura não é adequada para uma estação do Metrô, nem seria adequada para um terminal de ônibus. Quando o ciclista precisa deixar sua bicicleta em um local por um longo período, o ideal é a implantação de um bicicletário.


Qual a diferença entre um paraciclo e um bicicletário? Um bicicletário é um local onde há uma pessoa que controla a entrada e a saída dos usuários, identificando-o e sua bicicleta. O melhor modelo de bicicletário é aquele de fácil acesso, totalmente coberto, que identifica o usuário através de um documento e caracteriza a bicicleta (em alguns casos, tiram foto) e que disponibiliza cadeados numerados, garantindo uma maior segurança ao deixar a bicicleta no local.


Claro que existem diferenças entre bicicletários, por experiência utilizei um em que apenas identificava o usuário, sem fornecer cadeado e se você não tivesse um, poderia deixar a bicicleta sem problemas (mesmo com acesso controlado, não recomendo deixar a bicicleta sem cadeado). Um outro em que identificava o usuário e sua bicicleta e disponibilizava cadeado só se você tivesse um cadeado também, caso contrário não poderia utilizar o bicicletário (um certo exagero, do meu ponto de vista). E o último exemplo é o que considero melhor, identificação do usuário e sua bicicleta, além de tirar uma foto dela, e a disponibilização de um cadeado.


A última infraestrutura, para finalizar o texto, são as bicicletas compartilhadas. São Paulo teve a experiência de ter tido dois sistemas, um com estações fixas e o outro sem a necessidade de estações para retirar e devolver a bicicleta. Infelizmente, o sistema sem estação não teve êxito e atualmente o município conta com o sistema de estações fixas. A empresa que administra o sistema informa que existem 260 estações com um total de 2.700 bicicletas.


Uma pena não ter mais disponível no site GeoSampa o arquivo digital das estações de bicicletas compartilhadas. Provavelmente, se tivéssemos acesso à informação, sem ser pelo aplicativo da empresa, iríamos ver uma concentração das estações em áreas mais nobres da cidade, principalmente nas zonas oeste e sul (em sua parte mais a norte da região).


De maneira básica, o incentivo ao uso da bicicleta está em uma tríade que compõe a implantação de ciclovias e ciclofaixas, estruturas de bicicletários e paraciclos e sistemas de compartilhamento de bicicletas. Claro, há outros pontos importantes, como adaptações de velocidades das vias, melhorias na sinalização e construções de espaços seguros. É muito importante discutir com usuários, levando em consideração a questão de gênero e classe social, para criarmos infraestruturas funcionais e que incentivem cada vez mais o uso da bicicleta.


OBS: é mais do que preciso incluir na educação básica princípios básicos sobre direitos e deveres das pessoas no trânsito, desta forma teremos a formação de cidadãos mais conscientes e, espero, que respeitem mais a vida das pessoas no trânsito.


Recomendação de leitura


Abaixo segue link sobre como desenhar ruas seguras para os ciclistas, publicação do site Arch Daily



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